sexta-feira, 27 de setembro de 2019

SACERDÓCIO DE TODOS OS CRENTES


Uma reflexão para os dias atuais




Eraldo Luis Pagani Gasparini



Vou começar essa reflexão na ordem inversa, ao invés de começar contando o passado e continuando até os dias de hoje, farei o contrário.
Hoje, na atualidade (início do século XXI) as igrejas evangélicas no Brasil são extremamente hierarquizadas, há uma clara divisão em “povo da igreja”, “obreiros do Senhor” e “ungidos do Senhor”.
Nesta divisão dentro das igrejas evangélicas, tem os “ungidos do Senhor” que são a autoridade espiritual, os líderes do rebanho que devem ser obedecidos e não podem ser questionados; os “obreiros” que são aqueles separados do rebanho porque tem alguma aptidão (cantam bem, leem corretamente o texto bíblico, são carismáticos) e trabalham para executar as ordens dos seus líderes espirituais; por último o povo da igreja que não tem conhecimento da Bíblia, que vão a igreja somente atrás de bençãos, que não tem noção da graça de Deus e do evangelho redentor, que são literalmente como gado.
O povo brasileiro desde a época da colônia tem uma visão paternalista (ou maternalista), ele confia o seu destino, a sua vida, a alguém que seja poderoso, que o possa proteger, que possa cuidar dele. O povo brasileiro tem o hábito de conferir a outro a tutelagem de sua vida. Os termos “padrinho”, “pistolão”, estão relacionados a essa visão de mundo, onde alguém consegue um emprego ou “cargo” não por sua competência, mas pelas relações de poder e influência que tem. E essa cultura brasileira passou para os rincões evangélicos.
Mas essa cultura é remanescente da cultura portuguesa, que adotou isso da Igreja Católica Apostólica Romana que durante a Idade Média desenvolveu esse pensamento da Autoridade Eclesiática e da Tutelagem do povo. Na Idade Média havia uma clara separação em clero (sacerdotes) e laicato (leigos), somente o clero poderia ministrar a Palavra e os sacramentos, deixando os leigos em completa dependência ao mesmo.
E é nesse ponto que colocamos a Doutrina do Sacerdócio de Todos os Crentes estabelecidas pelos Reformadores Protestantes no século XVI.
Quando Martinho Lutero leu a Bíblia ele percebeu que tais estruturas hierárquicas não existiam na Bíblia, que Jesus Cristo havia provido livre acesso a presença de Deus, que não precisamos de nenhum intermediário humano para chegarmos a Ele. Todos os cristãos, todos os crentes em Cristo, são sacerdotes, todos tem a oportunidade de propagar as boas notícias do Evangelho.
Assim sendo não há nenhuma diferenciação entre o pastor e a ovelha, na verdade todos os crentes tem um dom, todos os crentes tem um ministério (um serviço) a prestar. Martinho Lutero teve essa percepção lendo a passagem de I Pedro 2:1-10, onde fala que todos os crentes são sacerdócio real.
Em A Liberdade do Cristão, Martinho Lutero escreveu:

De posse da primogenitura e de todas as suas honras e dignidade, Cristo divide-a com todos os cristãos para que por meio da fé todos possam ser também reis e sacerdotes com Cristo, tal como diz o apóstolo Pedro em I Pe 2:9 (…) Somos sacerdotes; isto é muito mais que ser reis, porque o sacerdócio nos torna dignos de aparecer diante de Deus e rogar pelos outros”.

Todo cristão é sacerdote de alguém, e somos todos sacerdotes uns dos outros. Isso valeu para a Igreja primitiva, valeu para os reformadores e deve valer para nós, igreja do tempo presente.