Uma reflexão para os dias atuais
Eraldo Luis Pagani Gasparini
Vou começar essa reflexão na
ordem inversa, ao invés de começar contando o passado e continuando
até os dias de hoje, farei o contrário.
Hoje, na atualidade (início
do século XXI) as igrejas evangélicas no Brasil são extremamente
hierarquizadas, há uma clara divisão em “povo da igreja”,
“obreiros do Senhor” e “ungidos do Senhor”.
Nesta divisão dentro das
igrejas evangélicas, tem os “ungidos do Senhor” que são a
autoridade espiritual, os líderes do rebanho que devem ser
obedecidos e não podem ser questionados; os “obreiros” que são
aqueles separados do rebanho porque tem alguma aptidão (cantam bem,
leem corretamente o texto bíblico, são carismáticos) e trabalham
para executar as ordens dos seus líderes espirituais; por último o
povo da igreja que não tem conhecimento da Bíblia, que vão a
igreja somente atrás de bençãos, que não tem noção da graça de
Deus e do evangelho redentor, que são literalmente como gado.
O povo brasileiro desde a
época da colônia tem uma visão paternalista (ou maternalista), ele
confia o seu destino, a sua vida, a alguém que seja poderoso, que o
possa proteger, que possa cuidar dele. O povo brasileiro tem o hábito
de conferir a outro a tutelagem de sua vida. Os termos “padrinho”,
“pistolão”, estão relacionados a essa visão de mundo, onde
alguém consegue um emprego ou “cargo” não por sua competência,
mas pelas relações de poder e influência que tem. E essa cultura
brasileira passou para os rincões evangélicos.
Mas essa cultura é
remanescente da cultura portuguesa, que adotou isso da Igreja
Católica Apostólica Romana que durante a Idade Média desenvolveu
esse pensamento da Autoridade Eclesiática e da Tutelagem do povo. Na
Idade Média havia uma clara separação em clero (sacerdotes) e
laicato (leigos), somente o clero poderia ministrar a Palavra e os
sacramentos, deixando os leigos em completa dependência ao mesmo.
E é nesse ponto que colocamos
a Doutrina do Sacerdócio de Todos os Crentes estabelecidas pelos
Reformadores Protestantes no século XVI.
Quando Martinho Lutero leu a
Bíblia ele percebeu que tais estruturas hierárquicas não existiam
na Bíblia, que Jesus Cristo havia provido livre acesso a presença
de Deus, que não precisamos de nenhum intermediário humano para
chegarmos a Ele. Todos os cristãos, todos os crentes em Cristo, são
sacerdotes, todos tem a oportunidade de propagar as boas notícias do
Evangelho.
Assim sendo não há nenhuma
diferenciação entre o pastor e a ovelha, na verdade todos os
crentes tem um dom, todos os crentes tem um ministério (um serviço)
a prestar. Martinho Lutero teve essa percepção lendo a passagem de
I Pedro 2:1-10, onde fala que todos os crentes são sacerdócio real.
Em A
Liberdade do Cristão,
Martinho Lutero escreveu:
“De posse da
primogenitura e de todas as suas honras e dignidade, Cristo divide-a
com todos os cristãos para que por meio da fé todos possam ser
também reis e sacerdotes com Cristo, tal como diz o apóstolo Pedro
em I Pe 2:9 (…) Somos sacerdotes; isto é muito mais que ser reis,
porque o sacerdócio nos torna dignos de aparecer diante de Deus e
rogar pelos outros”.
Todo cristão é sacerdote de
alguém, e somos todos sacerdotes uns dos outros. Isso valeu para a
Igreja primitiva, valeu para os reformadores e deve valer para nós,
igreja do tempo presente.